Resumen
Objetivo. Este estudo objetiva sistematizar e avaliar a produção científica nacional e internacional acerca dos fatores de risco psicossociais presentes no trabalho de gestores e como estes afetam sua saúde. Método. Realizou-se uma revisão sistemática da literatura. Foram seguidas as diretrizes do Protocolo PRISMA - Preferred Reporting Items for Systematic reviews and Meta-Analyses. Resultados. Verificou-se que os gestores estão expostos a riscos psicossociais relacionados às categorias tipo e produção de tarefas e saúde e bem-estar. A exposição a estes fatores de risco pode desencadear alterações físicas e mentais na saúde. Foram identificadas ações de intervenção e seus resultados, bem como a necessidade de desenvolvimento de ações de prevenção e promoção de saúde mental voltadas para gestores.
Palavras-chave Revisão sistemática de literatura; fatores de risco psicossociais; saúde; gestores
Abstract
Objective. This study aims to systematize and evaluate the national and international scientific production about the psychosocial risk factors present in the work of managers and how these affect their health. Method. A systematic review of the literature was done. For its development, the guidelines for conducting a systematic review proposed by the PRISMA Protocol - Preferred Reporting Items for Systematic reviews and Meta-Analyses were followed. Results. After the process of refining the results, it was found that managers are exposed to psychosocial risks related to the categories types, and production of tasks and health and well-being. The exposure to these risk factors can trigger physical and mental changes in the health of these workers, requiring prevention and mental health promotion actions.
Keywords Systematic literature review; psychosocial risk factors; health; managers
Introdução
Os fatores de risco psicossociais e o estresse ocupacional são reconhecidos como os principais problemas de saúde e segurança no trabalho contemporâneos, juntamente com a violência, o bullying e o assédio no ambiente laboral (Leka & Cox, 2008), gerando altos gastos para a saúde pública. Os fatores de risco psicossociais podem ser definidos como contextos sociais e organizacionais, relacionados à concepção e gestão de trabalho e são potencialmente indutores de danos à integridade física ou mental do trabalhador (International Labour Organization [ILO], 2022). Eles se relacionam ao conteúdo do trabalho e ao contexto em que a atividade laboral é realizada.
Com a pandemia da COVID-19, novos riscos psicossociais podem ter surgido ou os antigos podem ter aumentado, e se não forem devidamente avaliados e geridos pode desencadear o aumento dos níveis de estresse no trabalhador e, consequentemente, potenciais efeitos deletérios em sua saúde física e mental, incluindo sintomas graves, como alterações comportamentais, depressão, exaustão, ansiedade, esgotamento, pensamentos suicidas, problemas no sistema gastrointestinal, reações dermatológicas, fadiga, doenças cardiovasculares, distúrbios musculoesqueléticos e neurológicos (International Labour Organization [ILO], 2022).
Neste cenário, o trabalho dos gestores apresenta elevados níveis de demandas quantitativas, cognitivas e emocionais (Demiral et al., 2018), pois vivenciam, em seu cotidiano, elevadas cargas de pressão decorrentes das responsabilidades inerentes ao cargo e de aspectos, como: incertezas futuras, imprecisão na definição de tarefas e encargos, pouco reconhecimento, clima social prejudicado, insegurança, mediação de conflitos, integração de funções distintas e eliminação de outras, o que os torna mais vulneráveis ao adoecimento relacionado ao trabalho (Maffia & Pereira, 2014).
Estudos apontam que as altas demandas e a intensidade de trabalho dos gestores os levam a quadros de estresse crônico, esgotamento, alta prevalência de insônia e depressão (Persson et al., 2018). Esses profissionais são considerados como um grupo de risco para a incidência de problemas relacionados à saúde mental e apresentam uma das maiores taxas de ocorrência de suicídio (Graf-Vlachy et al., 2020). A elevada carga de estresse a que o gestor se submete, considerando sua responsabilidade com o alcance dos objetivos organizacionais, através da função de passagem e articulação entre as questões de gerência, de condução da organização e interesses e desejos dos vários grupos de trabalhadores é advinda dos fatores de risco psicossociais inerentes à função (Sá & Azevedo, 2010). No entanto, o conhecimento sobre as associações causais entre as demandas de trabalho estressantes e suas consequências é limitado (Fallman et al., 2019).
Estudos têm apontado a importância do processo de identificação e avaliação de riscos para definir medidas de controle adequadas, adaptadas às especificidades dos locais de trabalho, às necessidades dos trabalhadores e trabalhadoras e ao contexto específico (ILO, 2022). Este estudo analisou, por meio de uma revisão sistemática da literatura, as produções científicas sobre os fatores de risco psicossociais no trabalho de gestores e como estes afetam sua saúde, focando principalmente na forma como foram avaliados e geridos.
Método
Este estudo consiste em uma revisão sistemática de literatura. Tal método de investigação científica busca identificar, selecionar e examinar criticamente estudos realizados sobre uma temática específica, a fim de responder a uma questão claramente formulada. Para tanto, segue-se um protocolo claramente definido e os critérios a serem adotados para a condução do trabalho são determinados previamente (Mackenzie et al., 2012). Isso permite observar lacunas e falhas nos estudos realizados, verificar os recursos necessários para a construção de um estudo com características específicas, desenvolver estudos que cubram as lacunas na literatura e que tragam reais contribuições para um campo científico. Também propicia a sugestão de temas, problemas, hipóteses e metodologias inovadoras de pesquisa, além de otimização da utilização de recursos disponíveis em prol da sociedade, do campo científico, das instituições e dos governos que subsidiam a ciência (Galvão & Ricarte, 2020).
Para seu desenvolvimento foram seguidas as diretrizes para condução de revisão sistemática propostas pelo Protocolo PRISMA, Preferred Reporting Items for Systematic reviews and Meta-Analyses (Page et al., 2021), que recomenda a criação de um protocolo de revisão sistemática que descreve o fundamento lógico, hipótese e planejamento dos métodos da revisão, e das etapas elencadas por Galvão e Pereira (2014). Tais etapas consistem: (a) elaboração da pergunta de pesquisa, (b) busca de publicações sobre o tema na literatura, (c) seleção dos artigos, (d) extração dos dados, (e) avaliação da qualidade metodológica dos estudos, (6) síntese dos dados, (7) avaliação da qualidade das evidências, e (8) análise e redação dos resultados, para posterior publicação.
A investigação foi realizada com base em artigos científicos, nos idiomas português, inglês e espanhol, nas bases de dados Web of Science, PsycINFO, Redalyc, PubMed, PePSIC, SciELO e ProQuest, bases escolhidas devido à representatividade que possuem nas áreas de estudo, além de abrangerem grande dimensão de publicação de estudos nacionais e internacionais, acesso a textos completos e abarcarem estudos das áreas de psicologia e administração.
Como estratégia para o levantamento dos estudos foram considerados os descritores: psychosocial risks, work e managers, selecionados após pesquisa realizada na plataforma Biblioteca Virtual em Saúde e Psicologia do Brasil (BVS), Psi Brasil e utilizados nas buscas junto às bases citadas, utilizando os operadores lógicos booleanos e ferramentas de refinamento de busca disponíveis nas mesmas. Outros descritores e combinações foram testadas, como leader, health, work stress, manager health, em português, inglês e espanhol, porém, foram encontrados poucos resultados que atendiam aos critérios de inclusão. Desta forma, a busca final que compôs a busca em todas as bases de dados incluídas foi: psychosocial risks, work e manager.
Os critérios para inclusão dos estudos obedeceram às seguintes considerações: (a) artigos publicados em periódicos nacionais e internacionais nas áreas de psicologia, saúde e administração, (b) artigos publicados em português, inglês e espanhol, (c) artigos nacionais e internacionais, (d) estudos realizados no período de 2005 a 2020, (e) estudos teóricos e empíricos. Estudos referentes a teses e dissertações, estudos em duplicidade, capítulos e resenhas de livros, e artigos que contemplem os descritores, mas que não possuem relação com o assunto/tema foram excluídos.
Após as buscas, os resultados trazidos foram catalogados por base, através do software State of Art through Systematic Review (Start), versão 2.3.4.2, desenvolvido pelo Laboratório de Pesquisa em Engenharia de Software (LaPES), da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), que permite a análise dos estudos ao contemplar informações de publicação, autoria e leitura dos resumos, apoiando a seleção daqueles que se enquadrem no escopo da pesquisa.
Posteriormente à catalogação, os estudos foram analisados e filtrados considerando os critérios de inclusão e exclusão, seguindo para a leitura dos resumos e seleção final dos artigos que seriam utilizados no estudo. A seleção inicial trouxe um montante de 130 estudos. Após o refinamento, com base nos critérios de inclusão e exclusão, foram descartados os textos duplicados (n = 6), capítulos de livros (n = 1), estudos em outros idiomas (n = 1), estudos de acesso fechado (n = 1) e os que não versavam sobre riscos psicossociais no trabalho de gestores (n = 109), resultando em 12 artigos relevantes ao objeto de estudo, como apresentado na Figura 1.
As informações analisadas nos artigos foram organizadas considerando as diretrizes de análise temática propostas por Braun e Clarke (2006) que objetiva identificar, analisar e relatar padrões (temas), através da organização e descrição do conjunto de dados em detalhes. A flexibilidade deste método permite uma grande variedade de opções analíticas, o que significa que a gama potencial de argumentos que podem ser ditos sobre seus dados é ampla, favorecendo interpretações sociais e psicológicas.
Após a observação dos preceitos citados os estudos foram classificados em duas categorias, validadas pelos pesquisadores: (a) Tipo e produção de tarefas (carga e ritmo do trabalho, atenção, participação, concentração) e (b) Saúde e bem-estar (saúde, humor, energia, dores).
Resultados
Os 12 artigos selecionados foram publicados em 11 periódicos e em 4 áreas diferentes: Psicologia (n = 1), Multidisciplinar (n = 7), Medicina (n = 3) e Serviço Social (n = 1).
Os dados apontam que os riscos psicossociais são mais pesquisados por áreas multidisciplinares, voltadas, em sua maioria, à área de saúde ocupacional e pesquisa sobre o ambiente de trabalho, abrangendo questões relacionadas às doenças desencadeadas pelo exercício do trabalho e instrumentos de verificação, prevenção e intervenção a elas. As áreas de psicologia e serviço social buscaram identificar as percepções individuais acerca dos fatores de risco psicossociais a que os gestores são submetidos, enquanto a área de medicina avaliou as doenças ocasionadas por eles e suas implicações.
Em relação ao método de pesquisa e delineamento do estudo, foi encontrado maior número de estudos com abordagem dos tipos levantamento (n = 7) e estudo de caso (n = 4), com predomínio de pesquisas quantitativas (n = 9). A maioria dos estudos encontrados é de caráter empírico (n = 10), objetivando ancorar e corroborar informações e dados apresentados conceitualmente (Tabela 1).
Dentre os artigos selecionados, não foi encontrado nenhum realizado no Brasil, o que reflete a necessidade de estudos neste contexto, considerando o diferenciado cenário de atuação dos profissionais. A Tabela 2 apresenta as categorias temáticas de cada artigo, país, ano de publicação, idioma e periódico.
Tipo e Produção
Nesta categoria foram enquadrados três estudos (Tabela 3).
Verificou-se na análise dos artigos que compõem esta categoria que os principais riscos psicossociais existentes no trabalho dos gestores referentes ao tipo e produção de tarefas são: a carga de trabalho, as demandas quantitativas, a ambiguidade de função e o conflito de papeis, a desigualdade nas trocas sociais, a discrição de habilidade, a autoridade de decisão, o apoio, a qualidade das relações interpessoais, a necessidade de ocultar respostas emocionais negativas, as mudanças organizacionais e a insegurança no trabalho. Verificou-se também que uma porcentagem alta dos participantes das três pesquisas relatou altos níveis de riscos psicossociais em seu trabalho e apresentavam problemas de saúde relacionados às suas condições psicossociais de trabalho.
Pode-se verificar também que os fatores de riscos psicossociais que permeiam os resultados convergem. Os fatores mais destacados nos três estudos estão relacionados à elevada carga de trabalho e intensidade, conflitos de papeis e questões relacionais. Estes resultados corroboram com a literatura, que aponta a intensidade e tempo de trabalho, as exigências emocionais, a autonomia insuficiente, o mau relacionamento e trocas sociais no trabalho, os conflitos de valores e a insegurança como principais vertentes preditoras de riscos psicossociais advindas das características da atividade laboral (Luna & Gondim, 2021).
Os três estudos tinham como objetivo a identificação dos fatores de risco psicossociais por meio da aplicação de questionários fechados, tais como: Swedish Demand Control Questionnaire e Batería UNIPSICO. Nenhum dos estudos apresentaram propostas de intervenção ou de gestão destes riscos.
Apesar disso, os estudos não exploram a associação dos fatores de risco encontrados com as características da função de gestão, como exercício de múltiplos papéis organizacionais e grandes exigências psíquicas (Fidelis et al., 2000), tampouco propõem intervenções para o gerenciamento e supressão da condição.
Saúde e bem-estar
A categoria saúde e bem-estar é composta por nove estudos (Tabela 4).
Esta categoria abrange estudos voltados à saúde física, mental e bem-estar dos profissionais de gestão. A análise dos estudos aponta que os principais riscos psicossociais existentes no trabalho dos gestores referentes a saúde e bem-estar estão relacionados a distúrbios de sono, dores musculares causados por tensão, problemas cardiovasculares, exaustão física e mental, desencadeamento de vícios nocivos como tabagismo e alcoolismo, instabilidade psicológica, depressão e sofrimento psicológico. Tais resultados estão de acordo com a literatura que aponta problemas fisiológicos, comportamentais e psicológicos, como distúrbios alimentares, irritabilidade, dores de cabeça, perda de cabelo, perda de desejo sexual, doença física grave, aumento da pulsação e pressão arterial, dores musculares, problemas de sono, diarreia, indigestão, úlceras estomacais, problemas de fala, tabagismo, uso drogas e álcool, esgotamento, hábitos nervosos, aumento de erros, absenteísmo, falta de concentração, ansiedade, medo e tensão, problemas de memória, depressão, insatisfações, pânico, mau julgamento, preocupações e pensamentos catastróficos, sensação de solidão ou isolamento, superestimação do perigo, dentre outros, como possíveis efeitos deletérios da exposição aos fatores de risco psicossociais (Lipp et al., 2017).
Em relação a saúde física, os estudos encontrados apontaram relação entre exaustão mental e física ao final da jornada de trabalho e dores musculoesqueléticas, além destes fatores também estarem relacionados a problemas de sono (Sigursteinsdóttir et al., 2020). Em relação a estresse psicossocial e aterosclerose precoce, não houve correlação significativa (Bugajska et al., 2008).
Quanto à saúde mental, uma das variáveis identificadas como relevantes foi a estabilidade psicológica que apresentou relação com os riscos psicossociais e o estresse, além de ter impacto direto nas atitudes dos gestores (Mihailova et al., 2016). Dentre as mulheres, o sentimento de injustiça organizacional foi apontado como preditor de sofrimento psíquico e desencadeador de vícios (Kobayashi & Kondo, 2019).
Em relação ao bem-estar a questão de gerenciamento da segurança do trabalho foi apontada como significativa, podendo ser tratada com as abordagens que melhor se adequem ao contexto: (a) concepção instrumental, a qual enfatiza regras e regulamentos para lidar com riscos e garantir a segurança no trabalho, (b) concepção interpessoal, a qual considera o bom relacionamento entre as pessoas como a base para manter a segurança, e (c) concepção holística, a qual contempla a ideia da imprevisibilidade do indivíduo, portanto, as organizações devem estar preparadas e ter estruturas de apoio.
Foram encontrados quatro estudos que propuseram alternativas de enfrentamento do estresse laboral desencadeado pelos fatores de riscos psicossociais e suas consequências à saúde dos colaboradores. O estudo de Żołnierczyk-Zreda et al. (2016) examinou a eficácia do método Redução de estresse com base em atenção plena (mindfulness), constatando que aqueles que participaram do programa obtiveram níveis reduzidos de estresse relacionado ao trabalho, bem como um melhor bem-estar cognitivo (autoestima) e emocional, em comparação com os do grupo controle, sugerindo que os empregadores deveriam adotar e apoiar essa forma de gerenciamento de estresse no local de trabalho, com boa relação custo-benefício para seus funcionários.
O estudo de Demou et al. (2015) utilizou o modelo Early Access to Support for You (EASY), como uma alternativa para gestão dos danos causados pela exposição dos riscos psicossociais no trabalho de gestores e funcionários relacionados, propondo o desenvolvimento e a implementação de um serviço de suporte biopsicossocial baseado em evidências. Como resultado da intervenção, verificou-se durante o período de implementação do EASY junto ao Serviço Nacional de Saúde da Escócia que a taxa de ausência por doença no trabalho teve redução significativa e que a intervenção foi considerada como útil por gerentes e funcionários.
Stansfeld et al. (2015) investigou a eficácia do Managing Employee Pressure at Work, uma intervenção de e-learning para gerentes. O resultado da aplicação deste programa constatou que houve apenas um efeito muito pequeno da intervenção sobre o bem-estar do funcionário e pouco efeito sobre a ausência por doença.
O trabalho de Boysen et al. (2018) pretendeu verificar os efeitos e a aceitação de um treinamento feito para gestores, a fim de apoiá-los a lidar com seus próprios fatores de risco psicológico e com os de seus funcionários. Os resultados preliminares da intervenção apontaram melhorias significativas nos sintomas depressivos. Por outro lado, os resultados não demonstraram mudanças significativas nas escalas de saúde física e mental.
Diante desses resultados, os autores observam que, mesmo intervenções curtas de gerenciamento de estresse, podem melhorar o manejo dos gerentes com suas fontes individuais de estresse, para que, a partir dessas intervenções, eles venham a ter maior consciência do próprio bem-estar mental e gerar-lhes um efeito positivo.
A partir da análise dos artigos desta categoria verificou-se um predomínio de estudos que identificaram riscos psicossociais associados às saúde física e mental, e estudos que propuseram intervenções para gestão de riscos e avaliaram a efetividade dos mesmos. Não foram encontrados estudos voltados para a prevenção de riscos psicossociais.
Discussão
A partir da revisão da literatura verificou-se que os principais fatores de risco psicossociais no trabalho de gestores referem-se às categorias Tipo e produção de tarefas e Saúde e bem-estar. Em relação à categoria que trata de Tipo e produção de tarefas, foram identificados os riscos psicossociais a que os gestores estão expostos durante a execução da atividade laboral, relacionando-se a conteúdos referentes a variedade de tarefas, ritmo, volume e controle de trabalho, papel do trabalhador na organização, ambiente de trabalho, relacionamento interpessoal profissional e interferências com a vida particular, e sentimentos gerados pelo trabalho e saúde física e mental.
Tais resultados corroboram estudos anteriores que apontam que os gestores estão expostos a diversos fatores de risco que podem gerar impactos negativos à sua saúde mental, entre eles: a sobrecarga de trabalho, a falta de reconhecimento, os limites pouco claros na interface trabalho-vida pessoal, a baixa autonomia, os papeis ambíguos e o baixo suporte social devido ao isolamento associado ao seu cargo como, por exemplo, nas tomadas de decisões (St-Hilaire & Gilbert, 2018).
A categoria Saúde e bem-estar englobou estudos que abordavam os impactos e consequências que a exposição aos fatores de riscos psicossociais no trabalho causa aos trabalhadores, nos âmbitos físico e mental. Quanto ao comprometimento físico, podem ser ocasionados problemas relacionados ao sono, dores musculares causadas por tensão e problemas cardiovasculares. Tais resultados corroboram estudos anteriores que apontam impactos na saúde física de gestores (Sigursteinsdóttir et al., 2020). Em relação às implicações à saúde mental dos gestores, foram evidenciados: instabilidade psicológica, depressão e sofrimento psicológico. Estudos anteriores apontam que as altas demandas e a intensidade de trabalho dos gestores os levam a quadros de estresse crônico, esgotamento, alta prevalência de insônia e depressão (Persson Asplund et al., 2018), e que estes profissionais são um grupo de risco para a incidência de problemas relacionados à saúde mental.
Para estes fatores sugere-se que sejam realizadas ações de redesenho do trabalho, visando modificar e transformar estes em fatores de proteção. O redesenho do trabalho refere-se às modificações que o indivíduo pode promover em suas tarefas e relações de trabalho com o intuito de torná-lo mais compatível às suas próprias motivações, preferências, necessidades e competências e, consequentemente, torná-lo mais envolvente e gratificante (Devotto & Wechsler, 2018). Tais ações podem englobar: a diminuição da carga de trabalho, a redefinição de metas, o oferecimento de suporte organizacional e de pares, a definição de papéis e responsabilidades, entre outras. De acordo com Berg et al. (2010) ações para o redesenho do trabalho são favoráveis ao indivíduo, pois seus efeitos contribuem para a manutenção do controle sobre o próprio trabalho, para o desenvolvimento de autoestima positiva e para manter interações com os colegas de trabalho. Como consequência, o significado do trabalho e a obtenção de uma identidade laboral positiva também são favorecidos pelos resultados dos comportamentos de redesenho, refletindo diretamente sobre a satisfação no trabalho e o bem-estar físico e mental do trabalhador.
Referente aos impactos para a saúde física e mental, os estudos encontrados apontam que intervenções focadas na prevenção e promoção de saúde podem reduzir tais impactos nocivos à saúde dos gestores. Tais achados corroboram estudos anteriores que evidenciaram a efetividade de intervenções e ações educacionais sobre os indicadores de saúde mental de gestores como melhoria nos indicadores de estresse percebido, síndrome de burnout, depressão e gravidade da insônia em gestores que participaram de intervenções de gerenciamento de estresse (Persson et al., 2018; Boysen et al., 2018; Li et al., 2017).
Também foram apresentadas possibilidades de intervenções para prevenção e minimização destes impactos em nível individual. No entanto, também devem ser propostas ações a nível das equipes e da organização focadas nas relações interpessoais, visando o fortalecimento dos vínculos sociais entre o grupo de trabalho e a promoção de formação e informação. Para as intervenções de nível organizacional recomenda-se o desenvolvimento de programas de prevenção de riscos psicossociais, a potencialização da comunicação, a reestruturação e o redesenho dos postos de trabalho, a definição precisa das funções, a implantação de um sistema de recompensas justo, a delimitação dos estilos de liderança e a formação das chefias intermediárias e de topo (Eurofound & EU-OSHA, 2014).
Em nenhum dos artigos foi encontrado algum tipo de ação para prevenção dos fatores de riscos psicossociais. Ao identificar consequências negativas para a saúde física e mental dos gestores que a exposição aos fatores de risco psicossociais pode causar, verifica-se a importância do desenvolvimento de estudos que busquem identificação causal, gerenciamento, promoção de fatores protetivos e de intervenção a eles. Ações de prevenção em saúde podem contribuir para a redução dos efeitos negativos da exposição aos riscos do contexto do trabalho para a saúde dos gestores (Czeresnia, 2003).
Conclusão
Os resultados desta revisão sistemática da literatura evidenciam que os gestores estão expostos a fatores de risco psicossociais no trabalho que estão relacionados com o adoecimento físico e mental. Neste sentido, a identificação, monitoramento e gestão destes riscos torna-se importante, além de ações de prevenção e promoção de saúde mental de gestores. Além disso, a pandemia da Covid-19 acentuou a exposição dos trabalhadores a novos riscos psicossociais e o aumento de exposição a outros que os tornaram mais vulneráveis aos impactos que estas condições podem gerar sobre sua saúde mental (ILO, 2020).
Neste sentido, são necessários estudos futuros que identifiquem de que forma a pandemia e as mudanças ocorridas pós-pandemia afetaram o trabalho dos gestores. Sendo assim, pode ser necessário desenvolver estudos longitudinais, visto que estas possibilitam o acompanhamento dos efeitos dos fatores de risco psicossociais ao longo do tempo, o que pode auxiliar no planejamento de intervenções voltadas para prevenção e promoção de saúde. Também é necessário que os estudos futuros focados em prevenção de adoecimento sejam realizados, pois não foram encontrados estudos com este objetivo neste estudo.
Esta revisão sistemática de literatura apresenta algumas limitações. A primeira refere-se aos idiomas selecionados, pois é possível que estudos publicados em outros idiomas além do inglês, português e espanhol pudessem contemplar esta revisão sistemática, caso tivessem sido incluídos nos critérios de seleção. Os descritores utilizados nas buscas e o recorte temporal utilizado podem ter afetado os resultados.
Nesta revisão foram encontrados poucos estudos focados em identificar os riscos psicossociais presentes no trabalho de gestores e não foram identificados estudos com amostra brasileira, o que configura uma lacuna existente neste campo de pesquisa. Isto reforça a necessidade de que mais investigações com este foco sejam desenvolvidas. A partir da identificação dos riscos psicossociais presentes no trabalho de gestores, é possível planejar, implementar e avaliar ações voltadas para a prevenção e promoção de saúde.
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Datas de Publicação
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Data do Fascículo
Jul-Dec 2022
Histórico
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Recebido
28 Set 2021 -
Aceito
07 Out 2022